Artigo Científico

RELAÇÃO CIRCUNFERÊNCIA DA PANTURRILHA E QUEDA DE IDOSOS EM SÃO CAETANO DO SUL-SP - Volume 3. Número 2. 2023 e-ISSN 2764-4006 DOI 1055703 

RELAÇÃO CIRCUNFERÊNCIA DA PANTURRILHA E QUEDA DE IDOSOS EM SÃO CAETANO DO SUL-SP

Sarah Cerillo Lopes¹, Egidio Lima Dórea²

Endereço correspondente: xsarahcerillo@gmail.com

Publicação: 30/12/2023

DOI: https://doi.org/10.55703/27644006030203

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RESUMO

O envelhecimento gera mudanças, aumentando a suscetibilidade a muitas doenças, como a sarcopenia, fazendo com que haja dificuldade no andar e consequentemente queda, conhecida causa de incapacidade e morte na população idosa. A OMS considera a medida da circunferência da panturrilha inferior a 31 centímetros como um método para detectar sarcopenia. O objetivo é avaliar a relação entre o tamanho da circunferência da panturrilha dos idosos com o risco de queda ao longo da vida e identificar possíveis consequências destas. A metodologia foi uma pesquisa descritivo-exploratória com análise qualiquantiativa. Testes e questionários foram realizados com idosos do município de São Caetano do Sul, tendo sido 25 idosos sem quedas e 25 com quedas. Não houve diferença estatística significativa entre as médias das pontuações dos grupos selecionados referentes aos testes aplicados. Na amostra estudada não houve relação entre o tamanho da circunferência de panturrilha e número de quedas sofridas.

Palavras-chave: sarcopenia; queda; circunferência da panturrilha.

 

INTRODUÇÃO

O envelhecimento gera mudanças a nível celular, como o estresse oxidativo, disfunção mitocondrial e encurtamento dos telômeros, que aumentam a suscetibilidade a muitas doenças, uma delas é a sarcopenia. (1)

A sarcopenia, do grego, significa “pobreza da carne” e é caracterizada pela perda de massa muscular relacionada ao envelhecimento e consequente diminuição da força muscular, ocasionando dificuldade no andar. É um processo muito relacionado a quedas e um dos mais conhecidos por causar incapacidade e morbidade na população idosa (2,3). Envelhecer é um processo natural e multifatorial do corpo humano, porém pode ser acelerado quando há a presença de doenças crônicas (3), principalmente relativas a fatores de alteração neural e hormonal. Marzetti et al. (2017) relacionaram alguns fatores determinantes causadores da sarcopenia, dentre eles o envelhecimento, desnutrição, imobilidade, lesões, inflamações, alterações hormonais, como diminuição do estrogênio e aumento da miostatina, proteína que atua como fator de crescimento dos músculos (TGF-β) e que em altas concentrações inibe o crescimento muscular (4). Tais fatores atuam tanto diminuindo o anabolismo celular quanto aumentando o catabolismo, causando cada vez mais a perda de massa, força e função da musculatura. (5)

Essas mudanças no metabolismo celular ocorrem naturalmente e desencadeiam diminuição das atividades diárias e consequente processo de atrofia muscular, juntamente com acúmulo de gordura no interior do músculo e diminuição da força. Tais mudanças ocasionam uma maior dificuldade na manutenção de equilíbrio e do andar, provocando o aumento do risco de queda associado ao aumento da idade. (3,5,6)

A OMS valida a medida da circunferência da panturrilha como um método de detectar a sarcopenia. Medidas inferiores a 31 centímetros indicam a sua presença (1).

Nesse contexto, a avaliação da circunferência da panturrilha, uma medida antropométrica é um método simples e de baixo custo que possui potencial em auxiliar o médico a identificar pacientes com perda de massa e força muscular (1,6).

 

OBJETIVO

O presente estudo tem como objetivo identificar e avaliar a relação entre a medida da circunferência da panturrilha dos idosos e risco de queda em pessoas idosas de São Caetano do Sul, assim como observar as principais repercussões da queda.

 

MÉTODO

A população em estudo foi composta por 50 idosos (maiores de 60 anos) que se encontram nas Unidades Básicas de Saúde (UBS) e Centros Integrados de Saúde e Educação da Terceira Idade (CISE) do município de São Caetano do Sul. Sendo 25 com queda prévia e 25 sem queda prévia.

O reconhecimento de idosos que apresentaram episódio de queda no ano anterior ao da pesquisa foi feito através de inquérito e analisado por estudo descritivo e transversal. Os seguintes dados foram avaliados: idade, gênero, cor (raça), anos de escolaridade, estado civil e número de doenças crônicas, local, número e consequências de queda (hospitalização; traumas; redução de mobilidade).

A identificação da perda da capacidade funcional do idoso foi feita através da aplicação das escalas de Katz (Atividades Básicas da Vida Diária) (7) e Lawton (Atividades Instrumentais da Vida Diária) (8). Após a seleção dos pacientes, aplicou-se o método EWGSOP, configurado em 4 passos: Find cases, Assess, Confirm, Severity (FACS) (6).

Após a confirmação da sarcopenia através do método FACS, realizando apenas os passos 1, 2 e 4, foi medida a circunferência da panturrilha.

 

RESULTADOS

No início da pesquisa, para melhor entendimento da população analisada, foram aplicados questionários específicos. Foram entrevistados 50 idosos, onde a maioria dos entrevistados é do sexo feminino (58%), entre 60 e 70 anos (52%), com média de idade de 70,26 anos, predominantemente brancos (82%), com escolaridade entre 10 e 20 anos (50%), casados (52%) e com, pelo menos, 1 doença crônica (46%).

O número de doenças crônicas aumentou nos indivíduos com histórico de queda. Nos idosos sem queda, a maioria apresenta apenas 1 doença crônica (68%), enquanto nos idosos com queda, a maioria apresenta 2 doenças crônicas (36%). O número de pessoas com mais de 2 doenças crônicas foi maior na parcela dos participantes com histórico de queda quando comparado aos participantes sem queda (15 e 6 idosos, respectivamente).

Constata-se que a maioria dos indivíduos com histórico de queda é do sexo feminino (60%), 13 idosos (52%) estavam em casa quando caíram. Dos idosos que apresentaram consequências da queda: 28% de hospitalização; 32% trauma e 16% redução de mobilidade.

No que se refere ao método EWGSOP, foram realizados os passos 1, 2 e 4, tendo os seguintes resultados (Tabela 1):

Tabela 1 – Resultados do SARC-F

Aos passos 2 e 4 temos os seguintes resultados: sobre o teste de Tempo Levante e Senta 5x (TLS5), um teste t foi realizado para comparação das amostras avaliadas. A estatística t foi de -0,95, com grau de liberdade (gl) = 47 e p > 0,05.

O tamanho do efeito para a diferença entre os grupos foi calculado usando o d de Cohen, resultando em um valor de 0,30, que é considerado um efeito pequeno.

Acerca do teste Timed Up and Go (TUAG), foi realizado um teste t para amostras independentes para comparar as médias dos dois grupos, a estatística-t foi de 0,47, com gl = 45 e p > 0,05.

O tamanho do efeito para a diferença entre os grupos em questão foi calculado usando o d de Cohen, resultando em um valor de 0,15, que é considerado um efeito muito pequeno.

No que se diz respeito ao teste Hand Grip (HG), um teste t para amostras independentes foi realizado para comparar as médias dos valores estabelecidos. A estatística t foi de 0,31, com gl = 48 e p > 0,05.

O tamanho do efeito para a diferença entre os grupos foi calculado usando o d de Cohen, resultando em um valor de 0,10, considerado um efeito muito pequeno.

Avaliou-se também a circunferência da panturrilha de todos os participantes. Um teste t para amostras independentes foi realizado para comparar as médias dos grupos dos idosos com e sem queda. A estatística t foi de -1,5, com gl = 48 e p > 0,05.

O tamanho do efeito para a diferença entre os grupos foi calculado usando o d de Cohen, resultando em um valor de 0,47, que é considerado um efeito pequeno.

Além do mais, os participantes foram questionados acerca das escalas de Katz (7) (Atividades Básicas da Vida Diária) e Lawton (8) (Atividades Instrumentais da Vida Diária).

Pelo parâmetro da escala de Katz, nos indivíduos sem queda houve 21 classificados em A e apenas 4 classificados em B. Enquanto os com histórico de queda, apenas 16 classificados em A, 7 classificados em B, 1 em F e 1 em OUTROS, demonstrando que os idosos sem queda são mais independentes frente aos indivíduos com queda prévia.

Já na escala de Lawton, a média dos valores indicativos de dependência para os idosos sem queda é de 7,12 e de 6,88 para os com queda prévia. Também pode-se analisar que dos idosos sem queda, 20 são independentes (7 e 8 pontos), 4 possuem dependência leve (5 e 6 pontos) e 1 evidencia dependência moderada (2 e 3 pontos). Comparando com os idosos com histórico de queda, 19 são independentes, 4 possuem dependência leve e 2 são totalmente dependentes (0 pontos).

 

DISCUSSÃO

Observou-se que os idosos com histórico de queda apresentaram maior dificuldade na realização dos exercícios propostos (SARC-F, TLS5, Timed Up and Go e HG). Assim como a maioria dos indivíduos que indicaram o número 1 (alguma dificuldade) ou 2 (muita dificuldade ou impossível) em SARC-F estão representados pelos idosos com queda prévia, estes também manifestaram maior tempo bruto nos testes TLS5, Timed Up and Go e maior dificuldade no teste de HG comparado com os idosos sem queda, porém não relevante para qualquer efeito real relacionado a sarcopenia e consequente maior relação a quedas.

No que se refere a doenças crônicas, as quais foram apenas questionadas em quantidade, podemos dizer que as mais comuns nos idosos são: hipertensão arterial, problemas na coluna, diabetes, artrite ou reumatismo, doenças do coração, depressão, câncer, acidente vascular cerebral, asma e doenças crônicas do pulmão (9-10), sendo que os quadros clínicos de cada uma das doenças podem ter ligação com maior chance de queda (5,11-14).

Adicionalmente, podemos afirmar que o trauma é a maior consequência das quedas referidas, e que a maioria das quedas nos idosos ocorre dentro de casa (10-12). A consequência da queda, qual seja, pode acarretar perda de independência desses indivíduos (10).

Sendo assim, avaliando isoladamente cada resultado referente ao método FACS aplicado, temos que o resultado para o teste TLS5 indica que não há uma diferença estatisticamente significativa entre as médias das pontuações entre os grupos selecionados. Os idosos com queda prévia têm uma média bruta de pontuação de teste maior que o grupo sem queda e com maior desvio padrão, porém, com relevância baixa para qualquer efeito.

O Teste Timed Up and Go não apresenta uma diferença estatística significante entre as médias das pontuações entre os grupos avaliados.

O resultado para o teste Hand Grip indica que não há uma diferença estatisticamente significante entre as médias das pontuações, apresentando uma relevância baixa para qualquer efeito em questão.

Sobre a circunferência da panturrilha de todos os participantes, o resultado demonstrou que não há uma diferença estatisticamente significativa entre as médias das pontuações entre os grupos avaliados pelo teste em questão. Esses dados sugerem que não há relação entre o número de quedas e o tamanho da circunferência da panturrilha dos idosos com e sem queda prévia.

Até o momento, através da análise dos testes de Katz e Lawton, percebe-se que os idosos com queda são mais dependentes quando comparados aos idosos sem queda. Assim, os participantes que apresentaram queda prévia apresentaram maior dificuldade em realizar atividades de vida diária, revelando possível relação entre a queda, a consequência dessa e futura dependência do indivíduo.

 

CONCLUSÃO

A partir dos dados expostos, podemos afirmar que a circunferência da panturrilha não está diretamente relacionada a chance de queda nos idosos do município de São Caetano do Sul.

Contudo, verifica-se que os idosos com histórico de queda tem maior dependência, maior dificuldade de locomoção e menor força muscular, quando observados pelas análises de Katz e Lawton.

Até o presente momento, este estudo foi o primeiro a verificar a relação da circunferência da panturrilha e a chance de queda, assim como a ligação da queda com a qualidade de vida em idosos moradores do município de São Caetano do Sul.  Os  principais  achados  do  estudo  foram:  1)  não há relação entre o tamanho da circunferência da panturrilha e o risco de queda, 2) os idosos com queda prévia são mais dependentes, 3) histórico de queda dificulta a realização de exercícios de locomoção, força e movimento, 4) o risco de queda tem provável relação com maior número de doenças crônicas. O aspecto limitador do estudo e que pode influenciar nos resultados encontrados é o pequeno tamanho da amostra- 25 pessoas idosas em cada grupo.

Tais  constatações  são  relevantes, pois demonstram a maior necessidade de cuidados aos idosos, principalmente aqueles com histórico queda, como por exemplo atenção ao tratamento das doenças crônicas presentes e prevenção de novas, maior cautela em atividades de vida diária e ambientes de risco como escadas, tapetes e piso escorregadio. Tais cuidados buscam uma maior funcionalidade do idoso para melhor desempenho de tais atividades e consequente melhor qualidade de vida (5,10-14).

 

REFERÊNCIAS

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  3. Roubenoff R, Hughes VA. Sarcopenia: Current Concepts. The Journals of Gerontology Series A: Biological Sciences and Medical Sciences. 2000 Dec 1;55(12):M716–24.
  4. Zilbersztajn-Gotlieb, D. Bolsa 08/51566-6 – Doenças neuromusculares, Miostatina – BV FAPESP [Internet]. Fapesp.br. 2020. Disponível em: https://bv.fapesp.br/pt/bolsas/107574/estudo-da-expressao-da-miostatina-em-modelos-murinos-para-doencas-neuromusculares/
  5. Berlezi, EM. Fragilidade em Idosos Causas Determinantes. 1ª ed. Rio Grande do Sul: Editora Unijuí; 2019.
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